Waleska de Araújo Aureliano, antropóloga e professora do Instituto de Ciências Sociais da Uerj, compartilha descobertas fundamentais provenientes de duas décadas de pesquisa sobre a jornada das mulheres com câncer de mama. Essa investigação revela um panorama abrangente sobre como essas mulheres lidam com o processo de adoecimento, destacando a visibilidade, a busca por acesso à saúde de qualidade e a decisão em reconstruir ou não o seio após a mastectomia.
A professora ressalta mudanças significativas desde os anos 1980 na forma como a sociedade e, especialmente, os profissionais médicos encaram a doença. O discurso médico, antes fatalista, evoluiu para um diálogo mais aberto e franco com os pacientes sobre o câncer de mama.
Ela aponta que, há quatro décadas, a palavra “câncer” era um tabu, evitada tanto pelos profissionais de saúde quanto pelas famílias dos pacientes. Porém, ao longo do tempo, a percepção da doença mudou progressivamente. “Embora ainda haja um estigma considerável em torno do câncer, muita coisa mudou. A noção de que o câncer de mama é uma sentença de morte está sendo substituída pela compreensão de que é uma doença crônica, desde que as pessoas afetadas tenham acesso adequado a diagnóstico e tratamento.”
A antropóloga enfatiza a importância do acesso adequado à saúde, destacando que a ideia de que tudo depende apenas da disposição individual das mulheres para cuidar de si não é eficaz sem as condições ideais para que todas possam fazê-lo adequadamente.
Waleska destaca o papel da internet e das mídias sociais no aumento da visibilidade do câncer de mama, influenciando a narrativa das mulheres ao receberem o diagnóstico com a perspectiva de cura e qualidade de vida prolongada. Isso, segundo ela, altera a percepção sobre o próprio corpo e sobre o significado de ser mulher, independentemente da reconstrução mamária ou da quantidade de seios.
Atualmente, seu foco de estudo são registros fotográficos artísticos e textos autobiográficos de mulheres que enfrentaram o câncer de mama, marcando uma mudança na representação da mulher de vítima para empoderada. Esses registros refletem a consciência das transformações trazidas pelo diagnóstico e tratamento, além da perda do constrangimento em expor o corpo ou falar sobre a doença.
Para Waleska, é fundamental considerar a diversidade de experiências nessa trajetória. Ela destaca que as transformações não são universais, variando conforme fatores sociais, culturais, acesso à saúde, histórico pessoal, relacionamentos e contexto profissional de cada mulher.
Ao longo dos anos, a pesquisadora observou que, em alguns casos, a pluralidade de visões sobre o câncer de mama reforça padrões de representação do corpo feminino. “Após o câncer, algumas mulheres sentem a pressão de ter que se mostrar de determinada forma, como se simplesmente ser mulher não fosse o suficiente.”